domingo, 6 de abril de 2008

Fiama Hasse Pais Brandão





Por giestas, tojo e trevo
um dia abandonei-me. A medo,
na giesta roçar a espádua,
e no tojo a pele dos artelhos.
Dor, mágoa nesse caminho,
um dia seco entre montes.


Alcantilado amarelo,
crua miragem, passei
crente do amor e alma
que haviam de jorrar
para os inocentes.
Mas quem me dava
inocência ou magia?


Quem me conduzia
em caminhos de soleiras
de casa a casa vivas,
entre a giesta e o tojo?
Só o trevo me salva
da cega dor. Delíquio
entre flores minhas
que na Primavera
recobrem toda a estrada.


Eu vi, andei, e o meu pacto
de andar caminhos pobres
mais pobre foi no tojo.
Mais belo, alto, na giesta
o corpo consolou-se
e aceitou essa via
ao longo da estrada amarga.


Julgo que a obra de Fiama Hasse Pais Brandão, de que sou fã - embora reconheça não saber muito sobre o seu trabalho como dramaturga - é pouco conhecida entre nós, isto provavelmente devido à fraca divulgação que a sua obra tem tido, o que se passa com a maioria dos nossos "fazedores" de Cultura. Por esse motivo aqui deixo, humildemente estas breves palavras para que fiquemos a conhecer um pouco melhor mais um grande vulto das nossas letras.
Fiama nasceu em Lisboa, no ano de 1938. Notável poetisa mas também dramaturga, ficcionista e ensaísta. Viveu até aos dezoito anos de idade em Carcavelos, numa quinta tendo-se depois mudado para Lisboa onde viveu até 1992 para voltar a partir desta data a viver numa quinta. Foi aluna do St. Julian's School durante dez anos e frequentou o curso de Filologia Germânica na Universidade de Lisboa.
Fez crítica teatral, pesquisa histórica e literária sobre o séc.XVI em Portugal. Trabalhou como tradutora de Alemão, Inglês e Francês, de autores como John Updike, Bertold Brecht, Antonin Artaud, Novalis, Anton Tchekov e do Cântico Maior, atribuido a Salomão. Revelada, como Gastão Cruz, no movimento Poesia 61, que revolucionou a linguagem poética portuguesa dos anos 60, Fiama veio a demonstrar ser uma das principais vozes poéticas da sua geração. A sua obra caracteriza-se por uma grande densidade da palavra, o uso de uma poesia discursiva, por vezes fragmentária e sempre entrelaçando no discurso a metáfora e a imagem.
Escreveu o seu primeiro livro, Em Cada Pedra Um Voo Imóvel em 1958. Em 1961, com Morfismos, participou na publicação colectiva Poesia 61 - designação que foi dada a um conjunto de cinco «plaquettes» de poesia então publicadas, com a intenção de contribuir para a renovação da linguagem poética). No mesmo ano, foi editada a sua primeira peça de teatro, distinguida com o Prémio Revelação da Sociedade Portuguesa de Escritores.
Além da poesia e do teatro, a obra de Fiama estende-se aos domínios do ensaio, da ficção e também como já disse da tradução.
Fiama foi distinguida por duas vezes com o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores, respectivamente em 1996 e em 2000.

Algumas obras de poesia :

Morfismos (1961)
Barcas Novas (1967)
Novas visões do passado (1975)
Homenagemàliteratura (1976)
F de Fiama (1986)
Três Rostos (1989)
Movimento Perpétuo (1992)
Epístolas e Memorandos (1996)
Cenas Vivas (2000)
As Fábulas (2002)

Teatro:

Os Chapéus de Chuva (1961)
A Campanha (1965)
Quem Move as Árvores (1979)
Teatro-Teatro (1990)

Prosa:

Em Cada Pedra Um Voo Imóvel (1958)
Movimento Perpétuo (1991)
Sob o Olhar de Medeia (1998)



Nota: neste post foram utilizadas fontes diversas na sua maioria disponíveis na Internet

5 comentários:

Zé Povinho disse...

Barcas novas, é um título que li já faz uns anos, mas confesso que pouco ou nada mais conheço de Fiama. Esta é uma das maravilhas deste meio, aqui e ali lemos com prazer excertos de obras dos mais variados autores, alguns até dos que deviamos conhecer não fora a perguiça.
Abraço do Zé

Jorge P. Guedes disse...

Olá!

Publiquei uns dois iou três artigos sobre a Fiama hasse, exactamente levado pelos mesmos motivos que aqui referes: a sua reduzida divulgação junto de um público que não esteja directamente relacionado com o mundo das Letras.
Deixou-nos cedo uma das grandes vozes da poesia pportuguesa.
Ainda bem que a recordaste também.

Um abraço.
Jorge P.G.

Meg disse...

Ainda bem que te vejo por cá, aliás já te vi ontem. É bom sinal.

Pois o último artigo que li sobre a Fiama Hasse foi mesmo no Bigodes.

Mas tudo o que se puder fazer para divulgar os nossos autores é um contributo para atenuar a ignorância reinante, principalmente na juventude.

Fizeste e muito bem!

Um abraço

Jorge P. Guedes disse...

Passo e deixo, hoje, o meu abraço.

Jorge P.G.

José Lopes disse...

Li o poema da Fiama H. P. Brandão, e creio que é a segunda vez que leio algo desta autora.
Bfds
Cumps